Discurso de patrono em ocasião da formatura dos 3ºs anos do Colégio Ateneu
Caros pais, alunos, mantenedor, diretora, supervisor,
coordenadora e colegas professores do nosso querido colégio Ateneu.
Inicialmente, gostaria de agradecer a honra de estar aqui hoje
desempenhando um papel tão simbólico, diante de uma turma cujo progresso acompanhei
ao longo de três anos. Três anos que não foram fáceis, mas demonstraram que é
possível construir um caminho de confiança e respeito quando existe vontade.
Não exatamente aquela vontade que vocês tinham de fazer redação.
Tá, cansa, eu sei...
Mas o dia de vocês chegou, e parece que hoje, finalmente, mudaram-se os
papéis. Quem teve de fazer a dissertação fui eu.
Mas, enfim, eu deveria falar sobre o que a vocês?
Uma colega de vocês disse que um bom tema seria o futuro.
Por isso, eu resolvi fazer assim: um texto dissertativo ensaístico sem
proposta de intervenção ao final, cheio de perguntas. A nota no Enem seria
baixa. Bom, felizmente o mundo é muito maior e melhor do que o Enem.
Essa dissertação começa assim:
Você me pergunta sobre o futuro?
Quem não deseja ou já desejou saber sobre o futuro?
A felicidade está lá? Lá está o amor sonhado? Lá está o emprego ou
atividade profissional perfeita? Lá está a compreensão que ainda não recebemos?
Os bens materiais que desejamos conquistar? As pessoas que nos respeitarão? A
autonomia que desejamos? A família que gostaríamos de formar?
Ou, para quem leu “A Hora da Estrela” de Clarice Lispector, será que lá
está a Mercedes que atropelou Macabea depois de ela sair esperançosa da
consulta de uma cartomante que lhe disse que ela encontraria um grande amor?
Seria como essa a hora da estrela reservada para nós, ou seja, um futuro
de desilusão e dor?
O futuro irá nos trair?
Acredito que ao mesmo tempo pode ser uma coisa e outra coisa.
Existe um adágio cigano que diz que se você quer conhecer o futuro, você
deve conhecer o passado. Acredito que os professores de História concordam com
os ciganos. O passado nos ensina muitas coisas sobre o futuro. Por exemplo,
todos nós teremos momentos de alegria, de aflição, adoeceremos e veremos
pessoas que amamos passarem pelas mesmas situações que nós. Procuraremos nos
afirmar por nossa competência, desfrutaremos momentos de bem-estar, teremos
certezas, mudaremos de ideia, seremos confrontados em nossas verdades, nos
iludiremos e seremos desiludidos, nos sentiremos injustiçados em algum grau,
nos sentiremos vingados também em algum grau, passaremos por perdas dolorosas,
perceberemos que não temos tanto controle sobre nossas vidas quanto gostaríamos
de crer, precisaremos de ajuda, poderemos oferecer ajuda, e depois de infinitas
experiências, chegaremos ao fim de nossa existência. Daqui 100 anos seremos
histórias esquecidas ou contadas em fragmentos. Possivelmente seremos
informações perdidas em um mar digital caótico de fotografias, muitas selfies
com certeza, vídeos e áudios. O futuro a longo prazo é o fim de tudo que
conhecemos e de como conhecemos. Não é necessário ter o dom da profecia para
dizer-lhes isso.
Se o futuro pode então ser resumido dessa forma, penso que a grande
pergunta não deveria ser sobre o futuro em si, pois quem acorda o futuro faz
adormecer o presente, isto é, quem põe toda sua atenção nos desejos futuros
deixa de viver o presente e sofre com uma terrível ansiedade. Por isso, a
grande questão é como manter o estado de vigília, como estarmos despertos no
presente, para que ele valha de fato a pena. Porque um dia o futuro será o
presente, e ele então valerá a pena também. Assim não teremos deixado de viver
nenhum dos momentos de nossa vida em função de outros.
É com base nisso, portanto, que penso que, na verdade, a grande pergunta
seja: como viver o presente?
Alguns gostam da expressão Carpe Diem, como um sentido de viver
intensamente o presente. Mas talvez esse conceito ainda seja vago. Muitos
interpretam essa ideia de intensidade como algo equivalente a deixar que todas
as nossas energias sejam consumidas pelos prazeres mais imediatos, pela euforia
e pelas paixões intensas. Contudo, a ideia original é razoavelmente diferente.
Ela tem a ver com colocar cada coisa em seu devido tempo e lugar, dedicando a
cada coisa unicamente o que lhe compete. Hora de amar, amar. Hora de se comover
e chorar, se comover e chorar, hora de trabalhar, trabalhar, hora de
alegrar-se, alegrar-se, hora de sonhar, sonhar. Assim, a grande questão da vida
seria não subverter o que é apropriado a cada momento nem fugir ao que cada
momento propõe.
Nesse sentido, acredito ser importante acrescentar algumas ideias: se a
bebida serve para descontrair e confraternizar, ela talvez esteja no lugar
dela, entretanto, se ela é utilizada para que alguém consiga dormir, conversar,
namorar ou esquecer problemas, é bom lembrar que bebida não é remédio nem
psicólogo. A comida serve para alimentar. Se ela é usada como forma de
preencher vazios que vão além das questões fisiológicas, é bom lembrar que
comida não é um confidente apropriado. Se um amigo ou colega é usado para que
alguém se sinta superior a outra pessoa, é bom lembrar que nossos complexos de
superioridade e inferioridade merecem ser tratados de outra forma, assim como
nossos amigos. Se os nossos pais são tratados como carteiras abertas destinadas
a nos servirem com todo seu dinheiro, é bom lembrar que o único dinheiro
realmente nosso é aquele que resulta de nosso trabalho. E só para lembrar, se
um dia vocês tiverem um marido ou esposa e filhos e se esquecerem de se fazer
presentes e dedicar-lhes sua atenção e carinho verdadeiros, companheiros e
filhos não existem para ser responsabilizados pelas nossas frustrações, mas
para receberem nosso carinho, compreensão, respeito, atenção, afeto e amor.
E o que isso tem a ver com futuro?
Creio que quem cuida bem do presente, semeia o melhor futuro. O futuro é
o agora, e o que você faz agora encontra você logo ali adiante.
Saibam, portanto, que, no futuro, quando, por acaso, nos encontrarmos,
em nome do que fomos semeando nos muitos presentes do passado, você com certeza
terá meu abraço e meu desejo de que tudo esteja bem com você, que suas escolhas
tenham sido acertadas e que não lhe faltem sempre o bom ânimo e a esperança
para seguir adiante, nem a lucidez para avaliar seu presente.
Queridos alunos e alunas do terceiro, tamo junto!!
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